Eu e a minha mulher somos das poucas pessoas que andamos regularmente a pé pela freguesia e arredores, e óbviamente que vemos (e ocasionalmente fotografo) tudo o que se passa na estrada. Um destes dias fomos dar um passeio digestivo, depois de muitos de chuva em que tivemos de ficar enclausurados em casa, e quando passamos pela Ilha da Formiga reparamos logo que algo faltava ali. É então que nos apercebemos que os sobreiros tinham desaparecido do mapa.
Não queria acreditar no que os meus olhos me diziam e quase chorei de raiva ao aproximar-me dos tocos cortados rente ao chão. Comecei imediatamente a rogar pragas e a amaldiçoar quem teve a coragem criminosa de cometer semelhante ignomínia biológica, questionando-me acerca das razões de semelhante acto.
Desde que nasci que os sobreiros já ali estavam e nunca ninguém pôz em causa a sua posição (mesmo em relação à linha férrea) portanto, porquê? Quem foi o filho da puta arrogante que teve o desplante de cometer semelhante aberração ecológica?
Os três magnifícos desapareceram das nossas vidas e a minha mulher diz para esquecer. Estão cortados, portanto não posso fazer nada.
Não posso fazer nada?
Vou fazer de conta que não se passou nada e ninguém é responsabilizado?
Vou fechar os olhos e fazer de conta que nunca existiram?
A última vez que os vimos (pouco antes de desaparecerem) comentamos como estavam frondosos e magníficos, autênticas catedrais da mãe Terra, obras primas da natureza, monumentos nacionais centenários, ainda mais importantes que o caminho de ferro que sombreavam, e quando indaguei acerca do assunto soube que foi alguém ligado a esse estúpido e desinteressante caminho, absoleto e ridículo, um engenheiro ou encarregado da linha, que ordenou o abate das árvores. Esta linha, desconfortável e pirosa, já devia ter sido desactivada à mais de duas décadas e substituída por autocarros (como o foi durante algum tempo) proporcionando às camadas mais desfavorecidas da sociedade (os velhos e reformados) um serviço muito mais digno e prestável que o que presta nos moldes actuais.
Onde está o bom senso? A prestabilidade social? O futuro? Na mão de parolos.
Na noite que vi o desastre ecológico não consegui dormir tranquilo, e imaginem o que me passou pela cabeça durante a madrugada: usando o imaginário cinematográfico, se tivesse os poderes de Hancock pegava no responsável e empalava-o pelo cu acima num sobreiro jovem, ficando a ver actuar a força da gravidade nas homorróidas do espertinho, enquanto deslizava pela casca rogosa abaixo; ou se pudesse actuar pelas minhas próprias mãos, pegava nele, encostava-lhe a cabeça ao cepo do sobreiro maior e cortava-lhe a cabeça com a minha catana. Depois pegava nela e fazia como os Maias antigos: regava os outros dois com o sangue dela e espetava-a a seguir numa estaca ao lado da linha a olhar para a sua bem-amada ferrovia.
Não me entrepetem mal: não estou a ameaçar ninguém, só estou a dizer aquilo que era capaz de fazer. E se pensam que não o faria (se pudesse) desenganem-se - fazia mesmo. Odeio o tipo que ordenou o abate dos três magnífivos e não tinha nenhum tipo de contemplação em lhe fazer o mesmo.
E os responsáveis políticos da freguesia, que poderiam ter uma palavra a dizer sobre o assunto?
Esses não reconhecem a natureza como um valor a ter em conta. Contam é com ela para facturar mais uns cobres - como aconteceu no Inverno de 2009, em que aproveitaram as violentas tempestades que derrubaram algumas austrálias para cortarem dezenas de árvores nobre (e não só) para ganhar dinheiro na Quinta de D. António. A esses pendurava-os nos ramos que saissem pela boca, nariz e olhos do desgraçado empalado, de cabeça para baixo, deixando-os a reflectir na precaridade, futilidade e vacuidade da existência humana.
Agora vamos ver os fantasmas dos sobreiros (para a posteridade), enquanto amaldiçoou mais uma vez o filho da puta que ordenou o corte:
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