Esta coisa das editoras ficou-me atravessada na garganta. Uma queria que eu pagasse tudo, e com um bocado de sorte talvez recuperasse o investimento. Outra pagava (quase tudo) e no fim o mais certo era não receber nada. É quase a rima estúpida de um poema absurdo.
Mas o que me motiva neste momento é comentar a falta de ética destes jovens pseudo-editores de poesia com dois anos de vida: ainda são bébés e já querem comer este mundo e a cabeça do outro. Ainda por cima o segundo (a primeira era fêmea e o segundo é macho)foi tão mesquinho e lambe-botas (mal sabe ele que sou sapateiro, portanto percebo disso - de botas)e tão arrogante e senhor do seu nariz, que quando lhe atirei com alguns calhaus à mona (sou uma Cria de Viriato - é não esquecer) coisa que adoro fazer aos convencidos é atirar-lhes pedras de surpresa e ver como reagem, ameaçou-me logo com os seus Todo-poderosos advogados e com o dinheiro fácil que poderá arrecadar se eu o caluniar em público.
Nunca tive intenção de caluniar ou humilhar ninguém em público, a menos que ele mereça: tenho também direito à liberdade de expressão, tão árduamente conseguida com a revolução de Abril e consagrada na Constituição da Républica, ou não? Será que este candidato a rico depressa, a malabarista do sistema literário moderno, a usurpador disfarçado dos patos candidatos a vedetas da literatura nacional me mete medo? O porque haveria de ter medo? Se ele soubesse o dinheiro que tenho no banco esquecia logo a questão. Devo ser o Português com a caderneta de banco mais antiga do país. Só de pensar nisso dá-me vontade de rir.
Voltando à vaca fria, o indivíduo em questão no seu contrato dava as seguintes regalias: direitos de autor vinculativos, escolha e selecção dos poemas ao seu gosto (não respeitando qualquer tipo de cronologia, métrica ou vontade do escritor nesse capítulo)e despersonalização do designe gráfico do texto. 10% de comissão paga por cada livro numa edição inicial de duzentos, mas só com direito a pagamento ao fim de um ano depois da venda mínima de 357, sendo obrigatório perfazer o montante de 500 euros para que tal se concretizá-se.
Será que tenho o aspecto de ovelhinha de alva lãzinha a ser dócilmente levada para o corral? Serei mais um descaracterizado e estúpido escritor sem orgulho nem preconceito a vegetar neste país de segunda classe (ou será terceiro mundista)? Não.
O problema aqui do nosso amigo é a capa. Ele quer uma capa de luxo, uma capa que na estante de uma biblioteca caseira (burguesa) chame a atenção e seja perene. Exactamente, "fellows", uma capa elaborada por ele, de grande requinte: o texto é secundário.
A capa, a parte materialmente criada por ele é que lhe interessa. E o preço do livro? 15 euros, para quem puder pagar (os ricos?).
Os ricos não me dizem nada. Toda a vida vivi no meio deles e são as pessoas mais desumanas, burras e ridículas que conheço (salvo algumas excepções, claro).
O meu trabalho é para o cidadão comum e o preço da obra tem de ser a mais barata possível, para que a possam comprar e usufruir o conteúdo: não é para decorar a biblioteca de nenhum rico, que o mais certo é nem sequer a ler.
Nas minhas gravações de bandas e intérpretes dos anos sessenta, e até setenta, tive de escrever várias vezes o nome de uma música que sofreu todo o tipo de interpretações e clonagens possíveis chamada: "Nunca julgues um livro pela capa". Para ser sincero, sou tão selectivo que não consumo nada que não verifique se me agrada ou não, lendo antecipadamente dentro ou fora da obra todo o tipo de informação disponível para o tal.
A vida é curta e o tempo é de ouro.
Lamento viver num país onde os responsáveis pela cultura se preocupam mais com o dinheiro do que com a arte: e finalizo dedicando-lhes um provérbio - de Cabinda.
"Fumu abu ma kala va kikundu:
Befo,bana baleze, tinata ifundo".
Se ficaram curiosos e querem saber a tradução, vão ao Ministério da Cultura do Ultramar.